Bicicleta, fotografia de cena da rodagem e outras no bairro do Aleixo

A primeira vez que ouvi falar do “Bicicleta” foi algures em 2009 (?) pelo Valter Hugo Mãe que estava ou já tinha escrito o argumento para o Luís Vieira Campos realizar.  O argumento cumpria o desejo do realizador, filmar no bairro do Aleixo e com actores moradores do bairro, uma história sobre a condição humana emparedada no limite do instinto de sobrevivência a partir de um lugar simbólico estigmatizado onde a as coisas ditas normais e triviais adquirem diferentes ordens e importâncias. Se Newton lá vivesse e se do rés-do-chão deixasse cair a sua maçã, ela não cairia… ela subiria.

Em 2009 eu não conhecia bem o Luís, temos muitos amigos em comum e o Quintas de Leitura (do maravilhoso Gesta) foi a “mesa de café” para as amizades passarem de comuns e esporádicas para certas. Mas antes da amizade certa, eu aproveitei um intervalo de uma sessão do Quintas de Leitura de 2011 (?) fui ter com o Luís e com uma grande lata disse-lhe que quando ele começasse a rodagem do filme eu iria querer estar presente e fotografar o que ele me deixasse. Em 2013 finalmente o Luís conseguiu dois apoios financeiros e ligou-me a dizer que iria haver filme e que seu ainda estivesse interessado podia acompanhar a equipa e que apesar do seu orçamento ser extremamente pequeno ele iria tentar conseguir uma verba para mim. Imediatamente disse-lhe que não. Não à verba (pagamento) para mim, mas sim que queria participar. Disse-lhe que apesar de eu estar falido, não me parecia correcto estar a tirar verba de um orçamento que por si só acudia milagres à Blandina.  “Dás-me almoço e eu vou aparecendo como puder, mas tentando ver tudo”. Nunca me foi possível ver tudo. Pelo meio das rodagens tive de me deslocar a Lisboa para ser formador de workshop de vários dias que há muito estava agendado e por isso não pude, a exemplo, assistir à minha cena/diálogo preferida do filme, a cena da Maria com a Blandina (Adelaide Teixeira). Ainda assim, mesmo a meio tempo, foi um prazer e privilégio entrar no Bairro pela calma e olhar do Luís. Através dele, conheci habitantes do bairro com histórias fortes e assisti um pouco mais de perto à demolição da torre 4 antes da rodagem ter começado em Junho.

Corte de torre tipo do bairro do Aleixo

“A solução em altura adoptada responde a um problema económico de aproveitamento do terreno e implica condições de vida muito próximas das arreigadas nos seus futuros ocupantes, tendo havido o cuidado de reforçar este aspecto por judiciosa concepção do conjunto das galerias, das caixas de escadas e dos elevadores, ainda que, diga-se de passagem, com algum sacrifício do custo da obra.”
Desenho de corte tipo das torres do Aleixo, publicado no artigo “Aleixo Sempre” dos arquitectos Paulo Moreira e Mariana Pestana artigo foi publicado no J-A 249, Jan — Abr 2014, p. 282-297. http://www.jornalarquitectos.pt/aleixo-sempre/

Portas do elevador de carga num dos pisos da torre 3.

A casa de D. Maria Rosa Machado

A memória mais viva cujo recorte da imagem mantém-se bem definido é a de uma mulher em contra luz sentada em frente a uma janela no fundo de uma sala a ver televisão sem som. D. Maria Rosa Machado é o seu nome e mais tarde voltarei à sua história. Abaixo ficam algumas fotografias da sua casa que foi como uma base.

 

 

Manuela Barros, director de fotografia do filme.

Algumas fotografias do ambiente entre cenas e habitantes

Crianças atentas no preparar de uma cena na caixa de escadas.

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A mãe na vida real de Jorge Loureiro (antónio) e mãe de Maria (esposa do António) no filme. Intervalo entre takes na caixa de escadas.

Neta, diminutivo de Antonieta, à porta da sua casa.

Maria João no seu quarto vê telenovela enquanto na cozinha está a ser preparado o set para uma cena do filme.

Crianças moradoras brincam nas galerias da torre 3. A porta tapada com blocos de um realojamento.

André Guiomar e Manuel Pinto Barros, preparam câmara na caixa de escadas.

D. Rosa, 88 anos, na sua cozinha. D. Rosa vive sozinha e com mobilidade reduzida não sai do seu apartamento no 4.º andar da torre 3.

 

Último dia de rodagem.

Fotografia da equipa que estava a trabalhar no último dia de rodagem.

A curta-metragem “Bicicleta”, realizado por Luís Vieira Campos a partir do argumento de Valter Hugo Mãe, “Bicicleta”, inspirado no filme “Ladri di biciclette” (Ladrões de Bicicletas, 1948), de Vittorio De Sica, foi rodado integralmente no Bairro do Aleixo do Porto, com a participação dos seus habitantes e com o apoio da Açoreana Seguros SA e da Fundação GDA.

Depois das participações no 22º Curtas Vila do Conde (Prémio TAP – Melhor Média – Metragem Nacional), no Arquiteturas Film Festival Lisboa (Best National Short Film – Fiction) e no 20º Festival Caminhos do Cinema Português (Melhor Curta-Metragem e Melhor Atriz Secundária), “Bicicleta”, com duração de 48 minutos, inicia agora uma distribuição nacional através da rede alternativa de auditórios municipais e cineclubes.

 

Notas de Produção

Bicicleta partiu de um convite de Luís Vieira Campos a Valter Hugo Mãe para escrever um argumento, inspirado em Ladri di biciclette (1948) de Vittorio de Sica, cuja acção se desenrolasse nos nossos dias, tendo o Bairro do Aleixo, no Porto, como décor principal.
Uma das premissas do projecto foi envolver a população do Bairro do Aleixo na produção do filme e, em Fevereiro de 2009, com a colaboração da Associação de Promoção Social da População do Bairro do Aleixo, realizamos um casting para os moradores. O casting durou três dias e participaram cerca de uma centena de pessoas de ambos os sexos e de todas as idades. Com todos os interessados desenvolvemos um workshop de preparação para o trabalho de actor, dirigido pela actriz Sandra Salomé, no projecto desde o seu início para desempenhar o papel de Maria, a personagem principal do filme.
O desenvolvimento do projecto foi demorado; as normais dificuldades de financiamento foram agravadas pelos efeitos da crise financeira mundial que entretanto se faziam sentir em Portugal. Por outro lado, foi iniciado o processo de demolição do Bairro. Em Outubro de 2010 os habitantes começaram a ser realojados e em 2011 iniciaram-se os trabalhos de demolição da Torre 5 que culminaram com a sua implosão no dia 16 de Dezembro de 2011.
No final de 2012 Bicicleta conseguiu o primeiro apoio financeiro, concedido pela Açoreana Seguros SA. Este apoio viabilizou o arranque da produção, dando-se início aos trabalhos de preparação em Março de 2013. É neste momento que a Filmes Liberdade propõe uma co-produção à Cimbalino Filmes, outra produtora da cidade do Porto, que entrou no projecto com meios técnicos e humanos.
Entretanto continuava o realojamento de famílias e adivinhava-se a implosão de mais uma das Torres, aTorre 4. Decidimos aguardar pela sua implosão, que veio a acontecer no dia 11de Abril de 2013, bem como pelos trabalhos de remoção de escombros, para marcar a rodagem.
Em Junho de 2013 o projecto obteve mais um apoio financeiro, ao abrigo do concurso de apoio à produção de curtas-metragens da Fundação GDA e demos início à rodagem. Esta realizou-se de 17 de Junho a 4 de Julho de 2013 e foi efectuada com uma equipa técnica de 7 elementos. Filmamos integralmente no Bairro do Aleixo, nos seus espaços comuns e nas casas dos seus habitantes, que nos abriram as suas portas e nos ajudaram de uma forma generosa e incondicional.
A equipa artística, além de Sandra Salomé (Maria), foi constituída por Adelaide Teixeira (Blandina), Rute Miranda (Gorete) e Jorge Loureiro (António). Todas as outras personagens foram desempenhadas por actores não profissionais, na sua maioria moradores e ex-moradores do Bairro do Aleixo.
A montagem foi efectuada por Luís Vieira Campos que chegou ao corte final em Dezembro de 2013.
A maior parte da banda sonora foi gravada nos estúdios da Universidade CatólicaPortuguesa – Escola das Artes com Álvaro Teixeira Lopes (piano); José Pereirade Sousa (violoncelo) e José de Eça (voz). A banda sonora também integra a música “Por Um Triz”, de Alexandre Soares e Ana Deus, com letra de Regina Guimarães. Ana Deus e Alexandre Soares gravaram uma versão da música propositadamente para o filme.
No primeiro trimestre de 2014 foram efectuados os trabalhos de finalização (mistura surround; colorgrading e masterização) bem como de tradução e legendagem, sendo o filme finalizado em Março de 2014.