01 | SOLAR, Nelson d'Aires
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Carregamos todos um fogo, somos a fornalha que coze a pérola que nos é plantada nos ossos no momento em que saímos das mães para caminhar sobre esta terra. Esta vida é frágil e curta, e a noite é longa.
Às cegas, desbravamos caminho através de longos movimentos elípticos até chegar ao lugar da palavra que nos chama para erguer um refúgio e procurar alimento nas constelações. Num só gesto, deitamos o corpo sobre o solo argiloso e que nem vara de osso procuramos o murmúrio dos oceanos subterrâneos. Com as mãos batemos no chão. Batemos mais forte para abrir fissuras no solo e chamar a água à superfície. Deixamo-nos submergir, sentimos o borbulhar do som tocar-nos e na suspensão do corpo imaginamos uma casa térmica feita de adobe. Na segurança das casas observamos o ciclo das colheitas, o crescimento dos filhos e dos animais, o vigor da vegetação selvagem sempre à espreita da pausa dos homens para poder explodir de verde, e do som do comboio a rasgar a paisagem para o surto industrial da cerâmica, do descasque do arroz, da moagem e serrações. No lugar de árvores erguem-se chaminés industriais, elegantes, altas, construídas com a alvenaria feita da própria terra que sustenta os fornos na cozedura da cerâmica mas que não pára a grande ave migratória para longas distâncias à procura de sobreviver ao inverno. Os nossos filhos aprendem com as cegonhas-brancas a existência de novos invernos e voam também à procura de alimento e riqueza em terras mais quentes, para depois no verão regressarem e construírem as suas casas no alto de um pedaço de terra banhado de sol. É tudo muito rápido, ainda o querido verão vai a meio nos amores, nas manifestações de fé e pagamentos de promessas, quando sentimos a canção de setembro durante a queda das canas dos foguetes e que anuncia o arrefecimento da terra. Nós, os que cá ficam dentro da memória, depois de lavrada a terra, acolhemos os animais para o chão das casas. Os mais antigos, aqueles que sabem coisas do tempo, espreitam para dentro dos olhos de safira dos cavalos albinos e observam o sistema solar, para quando chegar o momento poderem anunciar o fim do inverno.

Nelson d’Aires. Setembro de 2017.