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“Ao escolher nomes como Paulo Catrica, Daniel Blaufuks, Inês d’Orey ou Nelson d’Aires, conta-se com o estilo já consagrado, sabe-se o que se espera. (…)
É uma imagem de Nelson Aires que abre Entre Margens. Podia ser qualquer outra. Como é habitual, este fotógrafo consegue sintetizar o gesto e a vida, o conceito e a sensibilidade numa imagem categórica.
Os espigueiros, o cavalo e o ferrador, aquela oliveira que pontua o afloramento de xisto… são o Douro, nesse arrepio de início do mundo que a cultura de si e o progresso material não conseguem excluir.”
Maria do Carmo Serén


“”Olhem, também somos assim”. E ‘assim’, também é com braços tatuados de arabescos e espinhos que seguram videiras prontas a plantar, como mostra a fotografia de Nelson d’Aires que se estampou na capa deste livro. Estão lá a força da mão humana e o saber que ajudou esta terra a ser ímpar e bela como hoje é. Estão lá o antanho e o sangue novo que se sente a correr nas veias mais salientes. Estão lá os gravetos desordenados que levaram séculos de sabedoria a apurar.
Esta fotografia de Nelson d’Aires é enviesada, aposta no músculo na diagonal como linha de força, marca-nos com uma pequena dose de rebeldia de quem se orgulha de estar prestes a cumprir um ritual que está muito para além deste instante, de qualquer instante.
O fotógrafo de Vila do Conde é um dos doze que foram convidados a deambular pela região com o fito de trazerem um olhar pessoal, contemporâneo, daquelas terras e daquelas gentes. No ensaio, a que chamou “Pedras”, não fugiu ao deslumbre pela paisagem e deu-nos,em paralelo, os sinais da acção e do engenho do homem, umas vezes em esplendor e harmonia (como nas copas de palha no topo de um monte), outras vezes em desafio e violência (como na ribanceira carregada de contrafortes e redes para evitar o deslizamento de pedras). Numa das mais extraordinárias imagens de toda a série, três cães em cima de um muro ameaçam, altivos, correr com intrusos (com o fotógrafo?). E através de imagens assim, sem os referentes mais óbvios, que sentimos a intensidade, o pulsar e as ressonâncias dos lugares.
Sérgio B. Gomes